Terroristas usam armas portuguesas (e passaportes)
"O recente atentado num cibercafé em Marrocos trouxe de novo a lume a realidade do terrorismo às portas da Europa e em particular da Península Ibérica. Os serviços de informações portugueses, em particular o SIS, estão em estado de alerta na sequência de uma maior ameaça terrorista à Europa a partir de Marrocos e Argélia, segundo soube o JN junto de fontes das secretas nacionais. Portugal ainda não é um alvo definido, mas a verdade é que o nosso país tem sido usado por redes terroristas como plataforma de apoio logístico e ponto de passagem, o que constitui enorme factor de preocupação.As autoridades espanholas, durante as investigações ao atentado de 11 de Março (11M) de 2004, que provocou a morte de 191 pessoas e ferimentos em cerca de duas mil, apreenderam aos terroristas armas, munições e documentos falsos com origem portuguesa, tendo disso dado conhecimento a Portugal. E a verdade é que a conexão portuguesa surge clara, de acordo com o conteúdo do processo judicial, em fase de julgamento.Nos autos, o libanês Mahmoud Slieman Aoun, um dos indivíduos implicados no 11M, e apontado como dando apoio à estrutura logística, usava a identidade falsa de Gabriel Slaim Aoun, fazendo uso da seguinte documentação portuguesa integralmente falsa um passaporte, uma carta de condução e dois bilhetes de identidade. As investigações espanholas e a operação posterior ao atentado, em Leganés, onde um grupo de suspeitos de ligação ao 11M se refugiara, acabando por se suicidar face ao cerco policial, levaram ainda à apreensão de várias munições ao grupo terrorista, 25 delas de 9 mm "fabricadas em Moscavide (Portugal), por 'Munições de armas ligeiras S.A. ('FNM 4 61'), anteriormente 'Fabrica Nacional de Cartuchos e Armas Ligeiras'".O mais significativo acaba por estar associado a armas. A Polícia espanhola apreendeu várias, entre as quais uma pistola-metralhadora Sterling. A arma fazia parte de um lote de mil adquirido em 22 de Abril de 1961 à empresa Sterling Engineerin Company LTD, pela empresa portuguesa Norte Importadora, de Lisboa, provavelmente para as Forças Armadas portuguesas. Foi apreendida uma outra arma igual e o processo acrescenta, citando as perícias realizadas, que "os serviços policiais britânicos suspeitam que ambas as armas foram parar muito provavelmente a uma série de empresas especializadas em inutilizar armas para o mercado de coleccionadores. É fácil recuperar uma Sterling inutilizada e faz alguns anos houve uma série de recuperações de armas reabilitadas adquiridas por simpatizantes do GIA em Espanha".E é precisamente o GIA (Grupo Islâmico Armado), que nasceu na Argélia nos anos 90, que está nas preocupações das secretas de vários países. Da cisão havida em 1998, surgiram os extremistas do GSPC (Grupo Salafista para a Predicação e o Combate).O GSPC, como o nome indica, bebe do salafismo, uma corrente dentro do islamismo que já em 2005 tinha recolhido as preocupações do SIS (Serviços de Informações e Segurança), no âmbito do Relatório de Segurança Interna, que dava conta de actividades paralelas como falsificações de documentos, tráfico de droga, lavagem de dinheiro e o envolvimento em redes de ajuda à imigração ilegal - de suporte a acções terroristas.De acordo com fontes das secretas, o ano passado o movimento manteve-se, e o GSPC levou a troca de informações entre o SIS e os congéneres europeus, em particular espanhóis. Circularam na ordem dos 150 relatórios de informação e foi feita a monitorização dos movimentos de indivíduos suspeitos de ligações ao terrorismo.As preocupações, no entanto, subiram de tom quando em Janeiro, o GSPC anunciou a sua ligação directa à al-Qaeda, ao mesmo tempo que ameaçava com ataques a França, Itália, Alemanha e Espanha, numa alteração de estratégia que veio a ser aprovada, via Internet, por Bin Laden.Até então olhado como uma ameaça local, a mudança de comportamento do GSPC levou a uma maior recolha de informação internacional também por parte do SIED (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa), junto dos congéneres ocidentais. E o recente atentado em Marrocos lançou um novo alerta, com o caso a chegar agora com mais frequência à mesa da Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT), onde além das secretas também as polícias têm assento. O 11M, em Madrid, marcou um ponto de viragem no encarar do terrorismo pelas autoridades. Foi durante as investigações que a Polícia espanhola deu conta de ligações directas entre o tráfico de droga, em particular haxixe, e outras actividades criminosas, como tráfico de armas, e o terrorismo. A razão de ser é o financiamento, que parece assumir duas vertentes, uma directamente para os operacionais, e outra para as estruturas superiores, como parece ser o caso das suspeitas sobre seis casos de lavagem de dinheiro recentemente divulgados no nosso país. As investigações ainda estão, no entanto, praticamente no início, dada a dificuldade em conseguir estabelecer uma ligação entre os movimentos financeiros, por um lado, e a origem desse mesmo dinheiro. O Norte de África constitui ,agora, uma proximidade perigosa, com a transformação do GSPC num braço da al-Qaeda, que entretanto tem vindo a divulgar ameaças ao Ocidente, também contra a ocupação do al-Andaluz pelos infiéis - leia-se o sul de Espanha e Portugal. O ano passado, no entanto, o acréscimo terrorista do GSPC já era sentido na Argélia e acabou por passar a Marrocos, depois de vários grupos locais , em particular o Grupo Islâmico de Combate Marroquino, terem sido desmantelados. As informações dão conta da existência de campos de treino no Sahel e infiltração de suspeitos quer na África bubsariana quer em Marrocos, onde o ambiente é cada vez mais preocupante. O ano passado, por exemplo, a Polícia marroquina fez dezenas de prisões no Exército, ao dar conta da existência no seio militar do Grupo para Apoio ao Regresso do Mahdi. Mas o atentado há duas semanas devolveu a preocupação. Carlos Varela" in Jornal de Notícias
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